Escolhi estes dois trabalhos porque, embora isso não seja visível, ambos se relacionam quanto a motivações e conteúdos. Além disso, são representativos do que me importa no trabalho e na vida.
Faço no/do meu trabalho aquilo que gosto, aquilo que é importante para mim. Não é nada de novo, aliás, é bastante comum, tem a ver exatamente com o comum a todos: afetos, sentimentos, emoções, amor.
Sempre foi assim… Principalmente no trabalho plástico…
A capa de CD foi pedida pela professora que estava a substituir a minha professora de Oficina de Artes. Lembro-me que ela era designer, muito ‘prática’, e concerteza tinha outros trabalhos em simultâneo… Provavelmente por isso, não nos acompanhava muito de próximo.
Penso que a intenção era realizarmos um exercício em que fossemos relativamente autónomos e pudéssemos simular uma situação profissional na área das artes visuais.
Foi sugerido que se escolhesse um álbum à nossa escolha e que se usasse os materiais/ técnicas que desejássemos. Era preciso apresentar a letra de uma ou várias músicas, esboços, estudos de cor, lettering, memória descritiva + “arte final”.
Desde logo me senti muito motivada, já gostava muito de música e dediquei-me com prazer a este trabalho. Mais na concretização do que no projeto… O projeto na verdade foi a concretização, as experiências no laboratório de fotografia e as descobertas “da pólvora” quanto às possibilidades dos fotogramas.
Baseei-me na letra e álbum do Jorge Palma, “Bairro do Amor”, que na altura foi marcante para mim e um “pretexto” para abordar o que eu queria: o amor. Tinha 16/17 anos e achava que tinha descoberto segredos preciosos, que todos os caminhos e ruas deveriam ir dar ao coração, a “praça central” no “mundo ideal” ou “bairro do amor”. E nos pormenores há mais umas quantas ideias parecidas.
Na altura este trabalho fez-me sentir orgulhosa e capaz de materializar e comunicar ideias/pensamentos/afetos de forma interessante e sem qualquer sacrifício.
Penso que aprendi que um projeto de design se pode resolver com um trabalho de artes plásticas/ ilustração, e ser mais rico por isso.
Nos dois anos em que dei aulas de desenho no ensino secundário, foi um dos trabalhos que propus aos alunos.
Aqui, poderão ver alguns desses resultados: http://bescascais.blogspot.pt/2011/06/desenho-e-banda-desenhada.html.
Na faculdade (4º ano) o panorama era diferente.
Aparentemente, o que eu fazia já não era grande coisa… Sabia que queria “falar” de muita coisa, mas não tinha o vocabulário para o fazer.
Eram muitas ideias, demasiadas hipóteses e caminhos possíveis. O mapa era mais complexo e tinha a necessidade de racionalizar, perceber definir coisas. Não conseguia. Foi difícil, pois queriam que eu tivesse as minhas motivações e a minha linguagem plástica única e original e nova no mundo… No 4º ano, na minha primeira avaliação de Pintura, tive um “Insuficiente” e um alerta: “o que é que estás aqui a fazer?”; “o que é que tens a dizer ao mundo que interesse?”.
E fiquei realmente (ainda mais) desorientada. Sentia-me simplesmente fútil. Com imensos trabalhos e trabalhinhos, sem qualidade. Era verdade, não tinham. (Teriam de ter?)
A minha professora teve, assim, um papel relativamente importante na realização deste trabalho (não totalmente pela positiva), porque me desafiou a provar que estava a fazer alguma coisa naquele curso. Não tinha nada a perder, sabia que o curso era o percurso a seguir, mas como?
O objetivo era criar algo novo e que provasse que poderia ser pintora.
Pus-me então à prova para fazer algo verdadeiramente significativo e que me interessasse pessoalmente. Começaram a surgir as minhas coisas e “aceitei-me”; estava a encontrar uma via possível para mim.
Para esta e outras pinturas desta altura, baseei-me no mesmo que no trabalho anterior: memórias de afetos, sentimentos, emoções, amor.
E assim aprendi a fazer o que quero fazer em pintura. Ainda hoje este quadro tem sentido para mim. Na altura, foi um trabalho de “viragem”, de concretização de uma série de espectativas. Penso que continua a ser, no seu contexto, um dos meus melhores trabalhos.
Consegui assumir que queria fazer algo abstrato e informe, que fosse simultaneamente pessoal e universal, a partir de fragmentos de memórias muito particulares e significativas (como uma carta de amor).
Quer eu queira quer não, é o que continua a estar no centro, onde vão ter as ruas e os caminhos.
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